Lidar com quebra de paradigmas não é fácil porque exige que nós
saiamos da nossa zona de conforto com relação às nossas filosofias de vida,
ideais, costumes, tradições e até mesmo conceitos doutrinais. Um deles é o
conceito de graça com o qual estamos acostumados a ouvir constantemente. É
comum vermos os nossos pastores, dentre outros oradores, que a Graça é um dom
imerecido. Assim tem sido pregado e nós, sem qualquer questionamento ou análise
bíblica, aceitamos de bom grado e assim repetimos em nossos comentários quando
é oportuno. Não está errado dizer que a graça é assim; porém, o conceito não
está completo. A graça é tão eterna quanto é eterno o próprio Deus; pois, está
intimamente relacionada com a natureza divina. Ora, se o pecado é o que nos faz
imerecedores da graça, então qual era o conceito dado a ela antes que existisse
o pecado?
Em todas as escrituras sagradas e em todos os livros de Ellen White,
entendemos que a graça é o amor de Deus em ação. A dinâmica criadora do nosso Senhor
revela o Seu amor pelas suas criaturas bem como o Seu próprio sistema de
governo. Por esse motivo é que a graça é um dom que não merecemos. Porque somos
dignos de morte; mas, o amor de Deus em ação revela a Sua infinita misericórdia
em conceder ao homem um tempo de graça para converter-se dos seus maus
caminhos, e poder viver eternamente no reino da Glória.
João em suas epístolas disse que Deus é amor, a Lei de Deus é uma
expressão de Seu caráter; logo, a Lei também é amor. Quando Lúcifer levantou
sérias acusações contra o caráter divino, ele introduziu dúvidas com relação à
Graça, que é o amor de Deus em ação, manifesto na Sua própria pessoa e no Seu
sistema de governo.
De acordo com o livro PP página 34, o principal motivo pelo qual Deus estabeleceu
o Plano da Redenção, foi para revelar o caráter DEle. Em outro livro, O
Desejado de Todas as nações, está escrito que "através do plano da
redenção, o governo de Deus fica justificado". A palavra justificação
aplicada ao pecador significa que, ao buscar a Deus com arrependimento genuíno,
ele é perdoado e absolvido da condenação da morte pelos méritos do sacrifício
de Cristo. Mas neste caso, a palavra justificação ganha um sentido mais amplo.
O governo de Deus não precisa de perdão porque é perfeito, mas antes que fosse
provada a sua inocência toda a sociedade universal contempla o desenrolar deste
processo chamado O Grande Conflito; então, ao apresentar Cristo, o Seu
sacrifício perante o Pai, cumprindo todos os requisitos da Lei, estando com a
natureza humana degradada por quatro mil anos, o governo de Deus é absolvido,
inocentado das acusações de Satanás. Seres celestiais e a humanidade, não terão
dúvidas e reconhecerão que Deus é justo e bom e que todos os Seus caminhos são
beneficentes. Consegue perceber que o
Plano da Redenção faz muito mais sentido para mostrar quem é Deus do que unicamente
para salvar a humanidade?
Conquanto os seres celestiais possuíssem natureza mais elevada que a dos
seres humanos, e embora essa natureza fosse imaculada, eles nunca foram e nunca
serão absolutos na esfera em que foram criados. Somente Deus é absoluto.
Somente ele tem o pleno conhecimento de si mesmo e de todas as coisas. Logo,
embora soubessem que Ele é amor, que a Graça é o Seu amor em ação, eles não
tinham plena compreensão sobre isso. Tanto que uma terça parte dos anjos se
rebelaram contra Deus e a outra parte que se manteve do lado de Deus teve
dúvidas, sem contar o fracasso de Adão e Eva, queda que aconteceu porque deram
ouvidos as dúvidas que Satanás queria introduzir em seu coração. Logo, o Plano
da Redenção, não somente foi colocado em prática para salvar o homem, mas para
revelar à toda sociedade Universal o amor de Deus. A graça não surgiu com o
Plano da Redenção, mas o mesmo é uma manifestação inaudita da graça.
Quando perdemos de vista o nosso foco - Deus. Quando nos concentramos em
nós mesmos e em nossas prioridades, revestindo-nos de um falso manto de
santidade, perdemos de vista o real sentido de sermos discípulos de Cristo. Centralizamos-nos
no grande conflito e agimos como se Deus tivesse que estar sempre à nossa
disposição para servir-nos. Agimos como se Deus fosse aquela pessoa camarada
que passa por alto os nossos defeitos porque nos ama e quer nos salvar. Devemos
ter a consciência que foi a rebelião de Satanás que o excluiu das cortes
celestes para nunca mais voltar. Precisamos entender que, conquanto Deus seja
misericordioso, não querendo que ninguém se perca, senão que todos cheguem ao arrependimento,
a salvação de todo pecador depende do seu interesse genuíno em reformar a sua
vida para ser qual Cristo, O Mestre a quem juga seguir. Nossa profissão de fé
deve revelar O Seu Originador. É quando nós nos lançamos aos pés de Deus em
nosso total desamparo e dependência, é quando debilitados, suplicando que Ele
exerça em nós tanto o Seu querer como o efetuar conforme a Sua santa vontade
que Ele opera em nós o desejo de contribuir para a salvação do caráter divino.
O mundo cristão perdeu de vista o puro sentido da graça. Outro extremo o qual
Satanás inculcou na mente humana é a ideia de um Deus tirano e arbitrário, que
fica a espreita desconfiado, esperando a manifestação dos nossos erros para nos
punir. Tal concepção chega a influenciar o pensamento de que Deus é sádico.
Quando aceitamos o chamado para sermos Seus missionários, o propósito da missão
está acima da nossa própria salvação. Revelar em nossa vida o poder
transformador da graça que opera mediante a fé e é vista por todos como o amor
de Deus em ação por Suas criaturas sem que um único ponto e vírgula da Sua
Santa Lei sejam revogados, torna-se o alvo supremo da nossa jornada cristã.
Diante do conceito que agora temos da graça e ao chegarmos à conclusão
de que o Plano da Redenção é uma manifestação inaudita da graça, colocado em
prática para revelar o caráter divino, podemos facilmente compreender a função
da igreja na terra. Mas para que tal afirmação não seja interpretada como sendo
uma ideia pessoal, citarei o que está escrito no livro Atos dos Apóstolos
página 9: "Desde o princípio tem sido plano de Deus que através de Sua
igreja seja refletida para o mundo Sua plenitude e suficiência. Aos membros da
igreja, a quem Ele chamou das trevas para a Sua maravilhosa luz, compete
manifestar Sua glória. A igreja é depositária das riquezas da graça de Cristo; e
pela igreja será a seu tempo manifesta, mesmo "aos principados e
potestades nos Céus" a final e ampla demonstração do amor de Deus".